quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Mulheres negras e política: raça e gênero nas eleições gaúchas.



                                                  Por Sandrali de Campos Bueno.[i]
  O cenário político, como todo, é um terreno bastante hostil para as mulheres. Infelizmente, ainda somos criadas visando o espaço privado, o cuidado com o lar, com a família e as atividades domésticas. A política, como coisa pública que é, ainda continua sendo um espaço em que as mulheres são colocadas em segundo plano. Embora o acesso das mulheres aos partidos políticos tenha aumentado significativamente, oriundo de muitas lutas das próprias mulheres, o poder continua concentrado nas mãos e nas vozes dos homens.
 No que tange às mulheres negras, esse quadro se torna ainda mais preocupante. O racismo, assim como o machismo, estrutura a sociedade e, portanto, embora sejamos a maioria populacional do pais, somos sub-representadas.  A Assembléia Legislativa gaúcha nunca elegeu uma deputada negra. O número de mulheres negras ocupando cargos no executivo brasileiro (prefeitas e governadoras) é pífio, além disso, os próprios partidos políticos silenciam as suas figuras públicas femininas e negras. O acesso aos recursos partidários para as negras é ainda menor, fazendo com que nossas dificuldades eleitorais sejam ainda mais expressivas. Concomitantemente, em decorrência da divisão sexual e racial do trabalho, nossas jornadas acumulam-se, o que obsta uma inserção mais incisiva de nossas companheiras nas disputas eleitorais.
 Embora tenhamos tres mulheres disputando o executivo nacional e uma mulher na disputa do poder executivo estadual, não basta ser mulher. É preciso estar conectada com as demandas dos movimentos de mulheres, comprometida com a efetiva reestruturação do sistema político brasileiro, com a promoção de políticas públicas contundentes que possibilitem maior espaço e condições para que cada vez mais mulheres concorram a cargos públicos e tenham possibilidades concretas de disputa.
Nesse sentido, os partidos são instituições chaves para operar uma mudança de cenário que propicie essas condições, principalmente em suas estruturas internas. É urgente que tenhamos um comprometimento das direções partidárias em garantir espaço  às candidatas mulheres, em especial para as mulheres negras. Este espaço, obviamente, deve ter reflexos no tempo de televisão, na maior visibilidade das militantes que encaram a dura tarefa de disputar um cargo eleitoral e, também, em ações que aproximem mais mulheres do cotidiano dirigente do partido. As cotas nas direções, em certa medida, são iniciativas que procuram solucionar essas questões. Contudo, se elas não são acompanhadas de outros empreendimentos, acabam se tornando apenas burocracias e cumprimento de resoluções que muito pouco contribuem para o empoderamento feminino.
As reivindicações das mulheres por políticas públicas que atendam as suas demandas têm cada vez mais ecoado na sociedade. Nada mais coerente, que essas vozes, feministas e anti-racistas, também ecoem nos espaços eleitorais. Estamos vivendo tempos muito férteis de participação feminina e negra na política, mulheres que se organizam para reivindicar e exigir direitos. É chegada a hora que essas reivindicações ecoem nos espaços de poder através de vozes que se identifiquem com elas, não por empatia, mas sim por vivência compartilhada.

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[i] Iyalorixá, Psicóloga, Especialista em Criminologia, Militante de direitos humanos e das questões de gênero e etnia.

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