sexta-feira, 25 de setembro de 2015

O que é uma família?


                                                Iyá Sandrali de Oxum
Antes de tentar responder a essa pergunta farei outra. Quem disse que tenho o direito de definir o que é uma família? Dizem, os meus mais velhos, que somos uma grande família. Uma família que se expande por muitos lugares e pomares. Na nossa tradição, vamos fazendo, durante os longos ou breves anos de existência, no mundo dito real, várias conexões de laços e enlaces que fazem com que, gradativamente, tecemos uma malha de elos que nos ligam uns aos outros, independente dos laços consanguíneos. São laços e escolhas que tecemos e fazemos através de experiência compartilhada pela necessidade de encontros e afetos que, muitas vezes, o agrupamento básico, responsável pela nossa existência no mundo, não dá conta. Eu nasci sem irmã. Mas hoje tenho a Eva, a irmã que escolhi aos meus vinte anos, mas também tenho outras tantas que fui conquistando, irmãs de todas as cores, vivencias e tribos,como a minha comadre Maria Inês, como a Diná, a Sonia, a Alvarina, enfim... Muito antes de conhecer a pessoa com quem me casaria, já tinha escolhido a Nadir, cozinheira do ICM, para chama-la de ‘minha sogra”, o que fez com que todas nos que tínhamos uma relação além da de trabalho, assim a chamássemos até hoje, embora eu tenha me divorciado e seu filho não seja mais o meu marido. Mas ele não deixou de ser o pai das minhas filhas, nem ela deixou de ser a “minha sogra. ”. Eu antes de parir já tinha uma filha, a Zélia, a filha que conquistei e me fez amorosamente “vodrinha” do Ariel e da Ju. Parece que estou escrevendo sobre coisas distintas. Parece, mas não é. Tenho tios e tias biológicos, tios e tias “emprestados” e, todos e todas, com suas ligações familiares, fazem parte da minha família; seus filhos e suas filhas, os filhos de seus filhos e filhas são meus primos e minhas primas. Mas também tenho a Janira que, mais que tia, é minha irmã. Bebeu o mesmo leite materno que eu e fomos criadas como se irmãs fossemos. Então a filha dela é mais que prima, ela é minha sobrinha.E a minha tia Breminha que também é minha mãe, pois ajudou a me criar. A filha da Eva não nasceu de seu ventre, mas é minha sobrinha e, também, é minha filha, por laços da tradição. Tenho três irmãos, de pai e mãe, sendo que dois já retornaram à massa mítica, mas tenho outros tantos que o são pelos laços da tradição, como o Edgar, por exemplo, que faz eu me sentir protegida sempre que a necessidade de compartilhar a saudade ou o conhecimento se faz presente. E, pela tradição um dos meus primos, tornou-se meu Bàbálorisá, meu pai. Seus filhos são meus primos, mas também são meus irmãos, mas alguns me percebem como tia, pois seu pai era considerado como filho de minha mãe. Tenho sobrinhas que são minhas filhas e tenho filha que é minha neta. Tudo isto sem qualquer resquício de distúrbio psicológico. Apenas sendo uma família com vários núcleos que se interligam através de relações de afeto, de compromisso e de tradição.  Somos uma família com muitos núcleos. Núcleos que formam uma rede de proteção, com os mesmos encontros e desencontros das famílias definidas como “normais”. Então senhores deputados, tirem seu preconceito e seu retrocesso de cima de nós. A família definida por vocês não nos contempla e o seu estatuto é letra morta, tal qual um pedaço de papel escrito com a mesma tinta que marcou os atos antidemocráticos
 da época da ditadura.